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Você sabe com quem está falando?

  • Marcus M. C. Gómez
  • 17 de jan. de 2018
  • 3 min de leitura

Sabe porque essa pergunta é tão usada?

Poderíamos analisá-la por diversos aspectos, social, econômico, jurídico e tantos outros. Contudo, o que nos interessa é a abordagem filosófica.


Analisaremos a legitimidade do porta voz.

Oque é isso?


A legitimidade do porta voz diz respeito a quem enuncia o discurso. Muito mais relevante do que o discurso em si, o porta voz do discurso precisa gozar de prestígio social para que se faça ouvir. Como assim?

O sociólogo e filósofo francês Pierre Bourdieu diz: “Os circuitos de consagração social serão tanto mais eficazes, quanto maior a distancia social do objeto consagrado”. Isso quer dizer que, quanto mais distante o porta voz estiver em escala social, maior a legitimidade e o prestigio por ele alcançados.


Você já ouviu o ditado “santo de casa não faz milagre”?

É exatamente o que Bourdieu explica em sua obra. Porém a legitimidade do porta voz vai muito além dos circuitos de consagração social. A posição social determina quem está autorizado a falar, ou não.

Quer um exemplo?

Em 20 de Novembro de 2017 foi realizado um evento em comemoração ao dia da consciência negra, comemorado nessa data. Nesse evento participaram os atores Taís Araujo e seu marido Lázaro Ramos. Casal reconhecido por suas atuações cênicas, ambos negros de origem humilde. Em seu discurso passional Taís Araujo denunciou como a sociedade brasileira ainda é pautada em uma cultura racista e classista. Ela culminou seu pronunciamento dizendo que “a cor do meu filho faz as pessoas atravessarem a rua no Brasil”.

Sabe o que aconteceu? Taís Araujo imediatamente virou alvo de escárnio e chacota. Em pouco tempo a internet estava inundada com memes debochando da declaração da mesma.

Exatamente uma semana após o dia da consciência negra, o ator Bruno Gagliasso e sua esposa, ambos brancos de olhos claros, foram vitimas de uma internauta que atacava a filha adotiva do casal por ser negra.

Curiosamente a nação se levantou em brados de protesto e revolta.

O que aconteceu? Qual a diferença?

É simples, aconteceu exatamente o que a atriz Taís Araujo denunciava em seu discurso. Ela e seu marido, por serem negros e terem origem humilde, ainda que tenham alcançado o sucesso profissional, não estão socialmente autorizados a falar. Enquanto um casal branco, de olhos claros e de origem não humilde tem o poder social para falar.


A classe média desenvolve um papel importante nos circuitos de consagração social e nos ditames de quem deve ou não ser autorizado a falar.


Devemos entender que a classe media sempre será conservadora. Porque?

Por que a classe média tem duas grandes aspirações, a saber, 1- ser a classe dominante, ou dona dos meios de produção, 2- não ser parte do proletariado base dos meios de produção.

Sendo assim, essa classe precisa que as coisas sejam como são, onde existe uma possibilidade de ascensão e menosprezo as classes menos favorecidas. Por isso a grande mídia é voltada para a classe média. É ela que determina quem tem a legitimidade do discurso.


Veja bem, um acadêmico, formado, pós graduado, mestrado, doutorado e pós-doutorado pobre, não vende nem de longe mais do que um milionário empreendedor que deu uma grande jogada financeira. Esse segundo será procurado para palestras, entrevistas e eventos, e seu discurso já é tido como verdade absoluta imediatamente após ser proferido, ainda que ele mal saiba falar ou assinar o próprio nome.

A questão não é enaltecer o discurso de autoridade por formação, mas sim mostrar como a legitimidade do porta voz se faz por posição social.

Imagine esse mesmo milionário, fazendo exatamente o mesmo discurso, uma semana antes de estourar. Ou seja, enquanto ainda era pobre. Quantas pessoas ouviriam o que ele fala? Quantas palestras ou eventos ele faria?

Exatamente, nenhuma.


Enquanto socialmente legitimarmos o porta voz e não o discurso em si, não adiantará nada do que se fala, mas quem fala. Ao perpetuarmos o status quo vigente, estaremos perpetuando a mediocridade e nada podemos esperar de diferente.

Sendo assim, encerro meu artigo parafraseando Mahatma Gandhi: “seja a mudança que você quer ver no mundo”.


 
 
 

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